Recomeços

Johnny Taira
3 min readJun 1, 2021

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Já faz um ou dois anos que eu tento recomeçar uma rotina de escrita por aqui, sempre fracassando. Falta assunto, falta repertório. Mas, acima de tudo, falta uma certa dose de autoconfiança em pensar um pensamento e verter em versos e prosas.

Não sei se quero escrever sobre meus sentimentos por aqui. Me parece tão brega fazer isso, transformar o site num blog pessoal. O receio de transparecer um pouco adolescente demais bloqueia um pouco a imaginação e os conteúdos possíveis.

Já cogitei também ir para uma abordagem um pouco mais jornalística, vamos por assim dizer. Escolher um tema. Pesquisar. Apurar. Checar. Mas simplesmente não quero. Estou com preguiça. E se falta embasamento naquilo que escrevo, qual a utilidade dele?

Passou pela minha cabeça criar um artigo mais técnico, voltado para a área de desenvolvimento de software. Mas me sinto engessado demais nessa temática. E não sei se tenho conteúdo o suficiente para trazer.

O utilitarismo me deixa com medo. O texto final precisa ter um interesse público. É preciso produzir conteúdo com algum propósito que chega, senão o alcance não é bom. Aí o bonde da inspiração, em seu último itinerário da madrugada, parte em direção à garagem.

Eu sinto um pouco de saudades da minha versão anterior. A versão da foto que ilustra este saite. Cabelo penteado, arrumado para sei lá qual rolê, numa pose meio supostamente inteligente. Sem medo de passar vergonha no Medium, apenas com vontade de escrever.

Passava por uma fase de transição de carreira. Me via cada vez mais como um… escritor? Gostava disso. Gostava de ver que minha escrita atingia alguém. Às vezes até mesmo um alguém desconhecido. Conheci algumas amizades virtuais assim. Portiolli sentiria orgulho.

Há controvérsias sobre o paradeiro daquele jovem rapaz. Assim como as minhas outras versões foram surgindo, se reconstruindo e destruindo.

Acho engraçado que muita gente me conheceu numa época em que era outro. Na verdade, praticamente todo amigo meu não conhece quem sou eu agora. Já vai fazer 18 meses que não os vejo. A última versão estável foi lançada em meados do distante ano de 2020. E desde lá não sou mais o mesmo. Muita gente só vê numa tela de celular um conceito daquilo que eu talvez possa ser.

Percebi o quanto sou outro enquanto entrava no carro. Acabara de sair de um exame. Na mão, levava um pão e um chocolate quente. Brinde do laboratório de imagem.

Em tempos anteriores, teria comido aquilo na própria recepção do café mesmo. Com calma. Mas o medo da pandemia me fez ir até o carro. Tiro a máscara desajeitado, o líquido quase caí no carro, eu vejo o trabalho que seria beber aquilo inteiro. Fico com cada vez mais pressa. Uma tensão irracional sobe e dou cabo ao copinho de chocolate. O pão eu como em duas mordidas, nervoso, o óculos embaçado. Fico a pensar em como as pessoas conseguem jantar com calma em algum restaurante, ou ir a bares, cultos, cafés. Não julgo, já estou num estado que eu não estou ligando muito para o que você deixa de fazer ou faz. Mas fico curioso em saber como cada pessoa consegue lidar com isso.

Num futuro recomeço, com as duas doses aplicadas e o pior momento residindo no passado, só sobra a neurose.

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Johnny Taira

Estudante de Jornalismo. Desenvolvedor. De vez em quando escreve no Medium. Contato: taira.jyundi@gmail.com